Primeiro dia do encontro é marcado  pela participação de atingidos (as) de  21 territórios ao longo da Bacia do Rio Doce e Litoral Norte Capixaba

Começou hoje, dia 24 de agosto de 2024, em Belo Horizonte, um momento fundamental para o processo de reparação dos danos causados pelo rompimento da barragem da Samarco (VALE/BHP), ocorrido em 2015. Representantes dos 21 territórios atingidos, distribuídos entre os estados de Minas Gerais e Espírito Santo, estão reunidos para discutir e eleger as pessoas atingidas para as instâncias de governança. Estas instâncias são responsáveis por deliberar, acompanhar, monitorar, validar e fiscalizar os programas de reparação em curso. 

Foto: Pedro Caldas

A importância do encontro para a reparação e a justiça

Foto: Alcides Miranda

Organizado pelas Instituições de Justiça (IJs), com apoio das Assessorias Técnicas Independentes (ATIs) e da gerenciadora do Orçamento Atingidos, Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (FLACSO), o Encontro busca fortalecer a participação popular no processo de reparação dos danos causados pelo desastre-crime. 

Em novembro de 2015, o rompimento da barragem de Fundão resultou no maior desastre socioambiental da história do Brasil, atingindo profundamente o modo de vida e o território de comunidades inteiras ao longo da Bacia do Rio Doce e Litoral Norte Capixaba. Desde então, a luta pela reparação integral dos danos sofridos tem sido um processo  árduo para as milhares de pessoas nestes territórios.

O Encontro é uma oportunidade para que os atingidos possam, de forma coletiva, apresentar a realidades que vivem, passados nove anos do rompimento, as suas demandas e propostas para reparação das comunidades, reforçando a necessidade de um processo participativo  e transparente. 

Construção coletiva

Foto: Glenda Uchôa

A programação inclui uma série de atividades voltadas para a construção coletiva e a reflexão crítica sobre o processo de reparação, e será finalizada no dia 25 de agosto. A mística de abertura que percorreu os cursos da Bacia do Rio Doce, de Minas Gerais ao Litoral Norte do Espírito Santo, apresentando as Comissões Locais Territoriais, marcou o início dos trabalhos hoje pela manhã. Em seguida, a mesa de abertura contou com a presença de diversas autoridades, incluindo representantes do Ministério Público Federal (MPF), Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG), Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Ministério Público do Espírito Santo (MPES), além de membros das ATIs, Comitê Interfederativo (CIF) e atingidas do município de Mariana(MG).

A luta por direitos

Foto: Wan Campos

O espaço também é uma oportunidade para ouvir os relatos das pessoas atingidas, que compartilham suas experiências e desafios enfrentados ao longo dos quase nove anos de luta por reparação. Na mesa de abertura, Mirela R Lino, representante da Comissão Local Territorial de Mariana, relembrou que “19 pessoas morreram no rompimento, e desde então, 68 moradores de Mariana faleceram sem ver o processo de reparação concluído”. Destacou também a importância do compromisso das Instituições de Justiça em garantir os direitos dos atingidos.

Luzia Queiroz, de Paracatu de Baixo, no município de Mariana, expressou o sentimento de frustração e dor que ainda persiste entre os moradores. “Nós somos massacrados todos os dias quando pedimos nosso modo de vida de volta. Está vindo uma Alphaville, mas nós não comemos casa. Entramos nessas casas e não nos reconhecemos, não reflete nossa realidade”. Ela criticou o modelo de reassentamento que está sendo imposto, afirmando que ele não atende às necessidades das comunidades tradicionais. “Tememos a volta para o reassentamento, pois é um modelo que não está funcionando. No nosso quintal não vai ter uma árvore, um canteiro; não podemos levar os animais porque não há espaço”, reforçou a atingida.

Debates e decisões sobre a governança das reparações

Foto: Tainara Torres

Neste primeiro dia foi  apresentado o regulamento do encontro, metodologia  dos trabalhos, as instâncias da governança e as regras para a participação do processo eleitoral. 

Josemar de Carvalho Ramos e Sergio Augusto Domingues, ambos representantes do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), destacaram o papel fundamental do CIF em conduzir as deliberações e evitar a judicialização dos processos, garantindo que a reparação seja justa e adequada para todos. “Nosso papel é fazer valer as deliberações e evitar que se tornem mais um processo judicial. Estamos aqui para honrar a reparação que é devida a cada um”, explicou Sérgio Augusto.

Lucimere Leão, da Cáritas Diocesana de Itabira, representante das ATIs da Bacia do Rio Doce, reforçou a importância da união das comunidades atingidas para enfrentar as grandes empresas responsáveis pelos danos causados. “Nós estamos aqui como essa colcha de retalhos, cada um de nós representa uma parte dessa colcha, e ela só fica bonita quando todos se juntam”, afirma.

Conclusão e próximos passos

Foto: Wan Campos

Este é um importante espaço de diálogo entre os membros  das Comissões Locais Territoriais de pessoas atingidas,  para elegerem seus representantes nas instâncias da governança. “Atingido virou sinônimo de luta e não apenas de vítima que teve seus direitos violados. Por isso, esse espaço virou sinônimo de luta pela garantia de direitos”, explicou Dr. Felipe Augusto, coordenador da Força-Tarefa do Rio Doce e representante do Ministério Público Federal (MPF). 

O encontro das pessoas atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão em Belo Horizonte representa um importante marco para o fortalecimento da participação popular e da justiça social no processo de reparação dos danos causados. A expectativa é que, ao final do evento, as comunidades possam sair com suas demandas claras e seus representantes definidos para continuar a luta por seus direitos e pela preservação de seus modos de vida que serão sistematizados numa Carta Compromisso dos (as) presentes do encontro.